Depois da guerra
- Andreia Ferreira Campos
- 24 de fev.
- 5 min de leitura

O que mudou na sua vida depois da guerra na Ucrânia? Que impacto social ou económico teve na sociedade em que vive? Depois da guerra que evolução pessoal destaca? Para a maioria das pessoas as mudanças são invisíveis, mas será que o pacifismo em que vivemos é real? Este artigo assinala os 3 anos da invasão russa na Ucrânia e a devastação que produziu.
3 anos depois
Não podia deixar de escrever sobre o impacto da guerra na Ucrânia no desenvolvimento integral dos europeus e da política da Europa. Bem, a verdade é que podia, mas não quis.
A perspetiva do desenvolvimento integral sobre um conflito como este é “ligeiramente” diferente do que tenho lido e ouvido ao longo dos últimos 3 anos.
Podemos apontar as consequências mais evidentes da guerra: o que é inegável, o que todos conseguem ver. Depois há todo um universo de influências não-tão-visíveis que surgem e nos apanham desprevenidos, quer dizer… nem todos estamos desprevenidos.
Uma das consequências da guerra é a desculpabilização das mudanças económicas e sociais que já estavam a acontecer. Tudo parece ser culpa da guerra. A economia parou: por causa da guerra. Não se vende: porque estamos em guerra. Os preços dispararam: é a guerra.
A guerra na Ucrânia feriu de morte os egos dos europeus que nunca imaginaram ser possível o regresso do terror à Europa depois da segunda guerra mundial. Nós somos os pacifistas crónicos e temos orgulho nisso (eu tenho), diplomatas natos (que ninguém pense que é fácil manter à mesma mesa 27 países com necessidades e prioridades diferentes) talvez por isso tenhamos resistido tanto a aceitar uma mudança de rumo.
Ninguém queria ter de investir na defesa da Europa. Ninguém queira acreditar que da Ucrânia escalasse um conflito mundial. Ninguém queria acreditar que a maldade de um conjunto de pessoas em postos de poder surgiria uma nova ordem mundial – ela aí está e a União Europeia parece ser o inimigo comum do totalitarismo russo e americano.
A Europa é uma ameaça porque é demasiado regulada? Por defender a saúde dos seus cidadãos e do planeta? Por travar os avanços desenfreados de grandes setores económicos que querem exercer poder sobre estados e anular ou usar a democracia para promover as suas contas bancárias?
Duas partes da mesma realidade
O sofrimento impede-nos de ver a imagem toda. E o sofrimento é contagioso. A dor dos ucranianos espalhou-se por toda a sociedade europeia, fosse pelas janelas da televisão, pelas redes sociais, ou por qualquer outro meio de transmissão de informação.
O contágio emocional é real, mesmo quando pensamos que estamos demasiado longe da guerra. Esta contaminação traduz-se em campanhas de ajuda para recolha de medicamentos, mantimentos, ou o que for mais necessário para ajudar os ucranianos a sobreviver. Traduz-se numa atmosfera de tristeza generalizada e negativismo transversal a toda a sociedade.
O constante não saber o que vai acontecer. A insegurança que é mais emocional do que física.
Que impacto tem este estado emocional no pensamento (mindset)?
A tristeza, e a insegurança que gera a guerra, impede-nos de ver a imagem toda. Salienta os aspetos que nos deixam mais inseguros e faz-nos negligenciar uma série de outros aspetos que relativizam os riscos. Isso influencia todas as tomadas de decisão estratégicas.
Há uma série de mudanças económicas em curso que não aconteceram por causa da guerra na Ucrânia, mas que talvez tenham sido parte da motivação para esta guerra e para as mudanças que vemos acontecer na ordem mundial.
É sempre a economia
As guerras são jogos de poder. O poder está sempre associado ao dinheiro e à economia (e à idolatria dos egos).
A destabilização causada na Europa pela guerra era o objetivo. Há a motivação territorial que apenas disfarça o que está por trás.
A União Europeia com as suas regras e cultura cosmopolita e pacifista, tornou-se tão poderosa que precisa de ser “eliminada”: dividida. A guerra na Ucrânia é um meio para atingir esse fim. Para atingir o coração da Europa: a democracia e o poder económico da União Europeia, os valores europeus.
As mudanças económicas já estavam em curso antes do início da invasão russa. Os preços iriam subir de qualquer forma. A escassez de alimentos em alguns países já era uma realidade inegável. A supremacia da tecnologia mantém os consumidores informados e os hábitos de consumo começavam a mudar. Mudam o suficiente para ter um pequeno impacto, que apenas os mais atentos valorizam.
Qual é a mudança geral da economia que já estava a acontecer?
A eliminação de intermediários nas cadeias de distribuição. Este processo é irreversível. Com as novas tecnologias a ligação entre produtores e consumidores é muito mais direta. É também transversal aos 3 setores: primário, secundário e terciário, embora a industria tenha um processo próprio, talvez mais disruptivo, o que requer uma nova organização.
Ao termos mais poder como consumidores, exigimos mais, a nível de qualidade e impacto do que compramos da saúde e no planeta. Ou seja, exigimos produtos europeus porque é na EU que está a regulamentação que nos protege.
Este é o maior impulso que podia ser dado para a transição para uma agricultura biológica mainstream. Apesar de os alimentos biológicos ainda serem a exceção, a tendência é para que sejam a regra. Os preços dos alimentos biológicos, em geral, não sofreram os aumentos absurdos que os alimentos não-biológicos sofreram – eu sei disto porque compro Bio.
A dependência dos combustíveis fósseis e a subida dos preços da gasolina, gasóleo e gás, que já era tendência antes da guerra, impulsionou os investimentos em energias renováveis.
A União Europeia reagiu em bloco, usando o seu poder económico e a sua influência para impor sanções económicas à Rússia e reestruturar as suas economias. E, mais uma vez, acertou. Ao contrário do que se diz nas notícias. Por isso é que a Rússia se alia aos Estados Unidos para diminuir sempre que possível a capacidade de interferência da União Europeia.
A Europa vai ser inteligente e usar o seu poder para travar este complô? Já está a ser – ao contrário do que se diz por aí. Sempre que algo perturbador acontece as notícias enchem-se de pessimismo. Temos razões para estar alerta, mas a razão mais profunda é que estamos a fazer um percurso tão bom que somos uma ameaça a políticos e empresários totalitários (das novas tecnologias).
Defender a Ucrânia é defender a Europa. Que todas as dúvidas sejam eliminadas da mente dos mais céticos, quanto ao apoio que deve ser dado ao povo ucraniano.
A má notícia? A Rússia continua a ter interesse em manter a guerra, porque a guerra é apenas uma desculpa para destabilizar e enfraquecer a Europa, a questão territorial é a desculpa interna para acalmar os ânimos dos russos que veem os seus soldados morrer. O que parece óbvio nem sempre é a verdade toda.
O desenvolvimento integral é uma forma de pensar, que nos leva a agir e a tomar decisões que muitas vezes divergem da norma. Não significa que não sejam as decisões certas.
Levo o paradigma do desenvolvimento integral para o meu trabalho como terapeuta da fala para ajudar os meus clientes a ultrapassarem as suas limitações de desenvolvimento ou comunicação. Levo-o para a vida, o que me permite ver o mundo de uma perspetiva integral.
O desenvolvimento económico e social, continua a ser desenvolvimento, e continua a ser integral.
Viva Integralmente,
Andreia
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